Com o lançamento de Nadir, os cearenses do
Facada se consolidaram mais ainda como a principal banda de Grindcore do Brasil
e uma das maiores do nosso cenário extremo. Sendo assim, aproveitamos para
entrevistar James e Ari, falando sobre diversos assuntos, desde o lançamento do
novo álbum e o momento atual da banda até sobre o cenário underground nacional.
E como não poderia ser diferente, tudo com muita consciência e sinceridade, sem
medo de falarem o que pensam.
Facada
1 -
Para os que ainda não conhecem o Facada, nos fale um pouco sobre a história e
influências da banda.
James: A banda começou em 2003 comigo
(james), ari e dangelo. temos 1 demo, 3 discos, alguns shows nas costas e desde
lá a gente toca grindcore. A formação hoje é james, david na bateria e danyel e
ari nas guitarras.
2 - Os
trabalhos anteriores sempre primaram pelo extremismo. Com “Nadir”, conseguiram
algo que parecia improvável, soar ainda mais extremos devido à influência mais
explícita de Black Metal. Isso surgiu naturalmente? O que esperar para os
próximos trabalhos?
Ari: Não acho Black Metal mais
extremo que grindcore. Acho que a influência de BM em alguns sons adicionou uma
sonoridade mais tétrica, funérea, inclusive Facada voltou a ter músicas com
acordes (menores) de verdade, o que não acontecia desde uma música no disco
“Indigesto”. Havia uma regra implícita de nunca tocar mais de duas cordas ao
mesmo tempo, que foi quebrada em “Nadir”. James pode contar mais sobre essa
influência já que ele é o grande Black Metaller da banda, inclusive na cor da
pele.
James: Grindcore e Black Metal sempre
serão estilos extremos e ós preferimos usá-los da piro forma possível. Foi bem
natural, não teve uma quebra e/ou ruptura na verdade. Saiu assim e a gente só
achou que tava bom. As músicas feitas pelo Ari e por mim e pelo Danyel saíram,
apesar de terem sido feitas em lugares diferentes e pessoas diferentes, tiveram
suas similaridades. Eu e o Danyel realmente escutamos bastante Black Metal
(temos até um projeto chamado Monge) e saiu naturalmente. Sempre que vamos
compôr, a gente tem a preocupação que o riff tenha um sentimento, uma aura seja
raivosa, negativa ou mesmo depressiva. É onde mora a beleza do riff. As
estruturas das músinas nunca seguem um padrão e são bem caóticas, então temos
que fazer riffs bons que sejam tocados talvez em uma parte apenas da música. Em
"O tempo será teu humilhado" nenhum riff é repetido na música.
3 -
Qual o significado do nome “Nadir”?
James: Nadir vem do árabe e é uma alusão
ao ponto mais baixo. É muito usado na geografia como o oposto ao zênite (ponto
mais alto), é o ponto mais inferior. Muitos autores usam como analogia ao mais
negativo, ao cume da inferioridade que uma pessoa possa chegar. Esse é o
significado.
4 - E
como anda a repercussão do álbum entre os fãs e a mídia especializada?
James: Só temos recebido críticas
positivas pelo albúm. Até agora não fui apresentado a nenhuma que desabonasse
nossa conduta...hehehehe. Acho legal que as pessoas estão lendo as letras,
muitas se identificam, sabem de cor, várias dizem que aquilo foi feito pra
algumas delas. E no grindcore é um pouco difícil isso acontecer. O álbum está
seguindo o caminho dele, as pessoas vão gostando, apresentando às outras e isso
vai criando um vínculo maior. Muitas gostam tanto que compram o Cd, a camiseta
e isso é melhor ainda, pois quem não tem acesso ao CD, as letras, a parte gráfica
está perdendo muito do conceito.
5 - A
arte da capa de “Nadir” é bem impactante e perturbadora. De onde veio à
inspiração para ela?
James: A arte foi feita pelo Everton
Luiz. O cara é broder nosso, é cunhado do Danyel e é um artista foda. É pintor,
quadrinista entre outras coisas. O cara é muito talentoso e a gente sempre
queria fazer algo com as coisas dele. Aí surgiu essa oportunidade. Eu mandei as
letras pra ele e disse que o disco tinha essa névoa, essa escuridão envolvida,
da redução do ser humano e sua influência negativa para o mundo. Pessimismo,
niilismo e misantropia. Então, um dia eu fui na casa dele e ele tinha feito
aquele desenho usando uma técnica nova, tipo como se fosse carvado no papel e
depois pintado com o giz de cêra por cima. E eu fiquei de cara, era aquilo
mesmo. Um "ser" sem forma, sem definição e inerte esperando. E era
isso que a gente esperava, algo inusitado e com personalidade. O mínimo de
photoshopagem possível. Tanto que ele desenhou TODAs as letras para que cada
uma tivesse um real sentimento e força. A inspiração veio do encarte do
FGYSFMYF (For God You Soul...for Me Your Flesh (1990)) do Pungent Stench e do Bestial Devastation, coisas de quem comprou
disco um dia.
6 - De
onde veio à ideia de homenagear Zé do Caixão? Vocês são fãs de filmes de Terror
B?
Ari: A ideia já era bem antiga
inclusive,a “letra” já estava organizada antes da música ser feita. Acho que
ela tomou força depois de ler a belíssima biografia Maldito: A vida e o cinema
de Jose Mojica Marins, o Zé do Caixão do
André Barcinski e Ivan Finotti. Sou fã do Mojica e de cinema “sério” e B em
geral (terror,ficção, exploitation, poliziotteschi, giallo etc). Pulo de
Costa-Gavras a John Waters com todo prazer. Os outros caras sinceramente eu não
sei, da última vez que chamei um deles pra ver o mais puro niilismo e
misantropia em forma de película, o verdadeiro grindcore em forma de imagens,
ele me perguntou: “Pra que ver essas coisas? Tu não tem uma comédia americana
não?” hahahahaha É vero!
James: Bem eu gosto muito de cinema
também. Assisto bastante documentários sobre pessoas e coisas. Vários de terror
vagabundos, mal feitos e velhos. Curtas e desenhos. Curto um besteirol também,
daqueles mais chinfrins. Mas, pelo menos eu,
quando estou num sábado à noite, bebendo uma cerveja gelada, na sala da
casa da família de outras pessoas, realmente não quero ver um bebezinho sendo
estuprado, ou mesmo um cara que enfiava umas agulhas nos orifícios dele e
expelia pela pele ou até um que gostava de caçar bichos no mato pra fazer sexo
oral com os mesmos e com anões hermafroditas. Desculpa, Ari. Sei que o Danyel
curte uns filmes underground europeu, muita coisa do submundo, sempre me
recomenda bastante coisa.
7 -
“Nadir” conta com participações especiais de Marcelo Appezzato (Hutt), John
“The Maniac” Leatherface (Chronic Infest) e Jão (Ratos de Porão). Como se deram
essas participações e o que elas agregaram de positivo para a música de vocês?
Ari: Tive a idéia de chamar o
Marcelo pra gravar “Josefel Zanatas”, porque sabia que ele era fã do Mojica e
principalmente por ser vocalista do Hutt, banda que escutamos pra caralho desde
a primeira demo. Incontáveis vezes acabamos o ensaio do Facada e ficamos
escutando “Sessão de Descarrego”, inclusive tem muita dobra de vocal no Facada
que dá pra imaginar de onde vêm! hehe Jão é uma grande influência desde meus 13
anos. A primeira música que consegui tocar com minha primeira banda foi
“Crucificados pelo Sistema”. Não tem
muito o que falar dele, é um dos melhores e mais influentes guitarristas do
Brasil (não me interessa masturbação guitarrística ), os solos quase me fizeram
chorar de alegria. No vinil terá um solo diferente do cd, melhor ainda! O John é amigo
da banda e foi convidado pelo James. Ele tem uma voz acima da média, realmente
impressionante, ficou demais!!
8 - Ari
mora na Alemanha. Sendo assim, como funciona a questão dos ensaios e os
processos de composição, produção e gravação da banda?
Ari: Me mudei logo depois do
lançamento do “Indigesto” então praticamente não existe ensaios, nem shows
comigo. Quando sei que vou pro Brasil
começo a compor. Vim de férias em 2009 ensaiei com o Dangelo umas três
vezes e gravamos uma parte de o “Joio”. Com o “Nadir”, só deu tempo de ensaiar
duas vezes e gravar a bateria. Tive que gravar guitarra e baixo em Berlin. Com
certeza não é o melhor método gravar com o mínimo de ensaios, mas é o que gente
consegue fazer e tem funcionado. De um lado é uma pena que não se pode
trabalhar um pouco mais as músicas, mas de outro lado rola 100% de
espontaneidade e grosseria musical, não dá tempo pra refinar nada. Estive há
pouco em Fortaleza e mostrei alguns sons pro novo baterista David, que aprendeu
rapidinho, mas não deu tempo de gravar. O ensaio foi filmado, daí ele decora as
partes deles, grava com o áudio do ensaio no fone, gravo minhas partes aqui e
já foi. Pura finesse facadística!
James: Nosso método é peculiar, mas
tem dado certo. Acho que cada banda dá seu jeito quando quer colocar a parada
pra frente. E a gente nunca pára de fazer coisa. Agora mesmo, o Nadir nem saiu
já temos alguns sons prontos pra ensaiar e uns covers pra um split fim do ano e
outras coisas. A banda é um órgão vivo e tá sempre compondo e de forma bem
concisa acredito.
9 -
“Nadir” é um álbum altamente pessimista, onde suas letras demonstram toda a
revolta e descrença com nossa Sociedade. Apesar de a internet e das novas
tecnologias permitirem um acesso mais democrático a informações, vemos o efeito
contrário ocorrer. Nas redes sociais, o que mais vemos são pessoas dando
opiniões sem embasamento e na base do achismo, fora a profusão de correntes e
mensagens de autoajuda. A tecnologia
esta emburrecendo o ser humano?
Ari: A internet é uma grande
ferramenta, o grande problema é o uso que se faz dela e de toda tecnologia. A
uma parcela da juventude precisa de apps pra tudo, até pra comprar fruta. Tem
pessoas que não andam mais de três
quarteirões sem olhar a porra do mapa no Iphone. Falo isso sempre que
vejo amigos caindo nessa armadilha. Se eu fosse o Morrissey
ia proibir nos meus shows além da venda de carne, o uso de
smart(?)phones. heheheh
Não tem coisa mais imbecil que ir pra show tirar e
foto e postar: “Aê mano to aqui no show do Satanation”. A experiência por si só
não importa mais, o que vale é mostrar onde você esteve, o que você viu, comeu
e bebeu. A tecnologia está mudando a forma de ação do cérebro, não se precisa
(?) mais pensar tanto, tem tudo diluído e simplificado no Google. Olha o
Googleglass chegando, você vai fazer parte da máquina e a máquina parte de
você. Tudo é
resumido pra caber um tweet, as fotos tem que ter esse filtrozinho que descobri
que se chamava instangram outro dia. Me falaram ontem que só os usuários de
determinadas marcas de smartphones ou
coisa parecida podem usar esse filtro, puta porcaria elitista. É incrível como
as pessoas se entregam a qualquer gadget moderno, sem o mínimo de reflexão,
gado humano mesmo. Ler um livro ninguém quer e nem dever ser mais possível pra
uma boa parte devido ao déficit de atenção. Não adianta demonizar o Skype, a Microsoft, a Apple, o Twitter ou o
Facebook, demonize sua própria fraqueza por cair nessa armadilha. Como diz a
uma parte da letra de “Amanhã vai ser pior”: evolução ou involução através das
máquinas? Você faz parte da massa ou se desgarra do rebanho e busca seu próprio
caminho? Olha o NSA controlando TUDO, a distopia tá batendo na porta!
James: O mal da humanidade é o ser
humano. Ele tem a ferramenta na sua mão para fazer o que quiser dela, mas é
emblemático que ele faça uma idiotice. Isso é inerente a nós, meros humanos,
fracos. Temos que demonstrar toda nossa fraqueza, invertendo os valores
tentando mostrar ao mundo aquele mero personagem a quem acreditamos como
verdade. O plástico, o falso é o que realmente importa. Não temos por que
acreditar e é nítido o regresso na humanidade, a total decadência e inversão do
que é de caráter verdadeiro. Tudo é falso, embutido, tem algo por trás. Nada é
transparente ou está às claras. E a internet só vem pra acentuar esse tipo de
atitude. E a isso ninguém escapa. Eu, você, todos estamos sujeitos a cair nessa
cilada. Da facilidade. De poder dizer o que você acha e a sua opinião balisada
no conforto do seu lar sem ninguém pra te retaliar. Ou mesmo, poder ser o
senhor da razão no seu mundinho particular. Essa é a vida higienizada e
plástica que as pessoas estão vivendo. Relações mecânicas e computadorizadas. É
comum ver uma família com filhos pequenos, cada um no seu mundo particular, no
seu smartphone, dando sua opinião sempre, criando pessoas egoístas e idiotas,
focadas apenas em relações inexistentes. As pessoas criam arquétipos de si na
rede, como pessoas altruístas, bonitas, malvadas, inteligentes, sexys,
descoladas, mas quando vemos a realidade é apenas um arremedo mal engendrarado
de burrice e mal formação física e estética. O fim é agora.
10 -
Aproveitando o mote, a internet e as novas tecnologia se tornaram uma faca de
dois gumes para as bandas. Ao mesmo tempo em que o advento do MP3 causa uma
drástica queda nas vendas de Cd’s, acaba permitindo que a música de uma banda
underground chegue a lugares que há 10 anos seriam impensáveis para a mesma.
Como o Facada lida com essa contradição?
James: A gente não tem contradição
nenhuma, cara. O que a gente acha mais importante e o total cerne da questão é
que escutem a banda. A primeira coisa. Não importa como. Nos tempos antigos
todos nós nos virávamos da melhor forma: gravávamos de fitas regravadas,
fazíamos cópias de video tapes velhissimas. Dávamos nosso jeito pra poder ouvir
aquilo. Por que era caro e difícil ter o material. E uma das qualidades da
internet é de poder escutar as bandas, de rever, de reouvir, de conhecer e
poder saber se você gosta ou não. Quem gosta realmente da banda vai comprar
nosso material. Mais cedo ou mais tarde, quando tiver oportunidade. Não nos
importa o POSER, aquele que só escuta no seu mp3 que tem milhões de música com
as últimas novidades e os melhores discos e ele não sabe o que colocar pra
escutar por que não tem histórico. Ele não sabe o que é bom, nem leu as listas
de agradecimentos das bandas pra conhecer outras bandas, nem leu um fanzine
físico pra saber como o underground funciona de verdade. Esses tipinhos a gente
dispensa. Respeitamos todos os que gostam da gente, que procuram saber e que de
uma forma ou de outra contribuem pra manter a chama acesa.
11 - As
gerações mais antigas davam grande importância ao material físico, a pegar um
Cd ou vinil, apreciar toda a arte, as letras, o material como um todo. Já essa
nova geração de fãs parecem não dar mais tanta importância a isso, se
contentando a ter gigas e mais gigas de música em um HD, normalmente baixados
de graça na internet. Dentro desse novo panorama, ainda vale a pena lançar um
Cd físico?
Ari: Sempre vão ter essas 1000
pessoas ao redor do mundo que se importam com música e com as bandas que gostam
de verdade. No Brasil é tudo mais volúvel, os fãs de música na Europa em geral
são bem mais fiéis e apoiam as bandas que acreditam de verdade. No Brasil essas
pessoas existem, mas em menor proporção. E nosso estilo não é, nunca foi e nem
provavelmente será algo super popular e passível de hype como são outros estilo
dentro do metal/hardcore, é música pra pouca gente no mundo, no Brasil menos
ainda.
12 - A
indústria musical passa por uma grave crise e muitas gravadoras estão em grande
dificuldade. Acham que esse modelo atual de negócio ainda tem algum futuro ou
está destinado a morte? Como enxergam o mercado musical daqui a 5, 10 anos?
Ari: A indústria tá se reinventando
pra sobreviver e as estratégias das bandas também. Não me surpreenderia se num
futuro bem próximo algumas bandas começarem a vender a permissão para os fãs
acompanharem a banda durante um período de gravação, turnê ou participar da
festa no backstage depois dos show. Já ofereceram bate-papo pelo Skype outro
dia. Sem tem uma coisa que não tem limite, é safadeza. E muito sinceramente se
a indústria acabasse amanhã e ninguém mais gravasse nada, não seria nenhum
drama, já estamos providos de música maravilhosa até o fim dos dias. Obviamente
essa indústria não tem nada a ver com a gente, nem a gente com ela, só
trabalhamos com pequenos selos, gente com essência.
James: Concordo com o Ari. Tudo de
bom já foi feito, acho bem difícil algo de hoje em dia ser superior a algo já
feito. Hoje em dia as melhores bandas que escuto são as antigas e me deixa
feliz saber que ainda existem TANTAS outras a serem descobertas: demos
perdidas, splits, ensaios, projetos, cada dia descubro uma banda antiga nova o
que me deixa bem feliz. A indústria musical se auto sabotou e hoje está pagando
por todos os anos de abuso e exploração, mas realmente pouco me importa, não
sei o que realmente se passa nesse mundo de milhões envolvidos. Acredito que
muitas gravadoras underground estão permanecendo por que nunca tiveram lucros
exorbitantes, nem grandes gastos, elas sempre estiveram cientes do seu mercado
e do seu nicho. Pra gente pouco importa o mercado musical. Tanto faz como ele
esteja daqui, espero que o pior possível pra eles. Nós, e falo em nome do
underground verdadeiro, sempre sobrevivemos a quaisquer mudanças, pois nossos
maiores trunfos são: fazemos por nós mesmos e nos adaptamos a todas as ondas e
dificuldades.
13 - Em
2013 a banda está completando 10 anos de carreira. Planejam algo para comemorar
essa data?
Ari: Tive a ideia desde o ano
passado de gravar um ep de 10 anos da banda, mas o pessoal não se ligou muito
na idéia não. Apesar de eu ter ido duas vezes pro Brasil esse ano, fato
extraordinário que nunca mais ocorrerá, não conseguimos gravar. Pelo menos a
formação original + Danyel tocou no show de lançamento de “Nadir” em junho, que
foi o último show do Dangelo. Na verdade foi de longe meu pior show, estava há
menos 24 horas na cidade e não tivemos como ensaiar, quando desci do palco
melhorou bastante. hehehe
James: Esse ano saiu nossa demo em 7" entre o selos Zuada Recs, Nervura Distro, Two beers
or not two beers e Sonoros Recs.
Foram prensadas 400 cópias em vinil preto. Temos planos de lançar o Indigesto
esse ano ainda em CD e vinil, basta só a gente sre mais responsável e fazer de
novo o encarte. O Nadir saiu em CD pela Black Hole e tamo esperando o vinil
sair pela Laja Records e EveryDayHate. Fora que já queremos gravar essas
músicas novas e uns covers que são surprise. Ainda tem um lance de um documentário
aí que eu nem sei em que pé está...Eu acho que pra 10 anos de banda tá massa.
14 -
Quais as maiores dificuldades enfrentadas nesses 10 anos?
Ari: A nossa desorganização
crônica. Mas se não fosse assim não
seria Facada e não teria sido tão bom e genuíno. O fato de o Brasil ser tão
grande também não ajuda em nada, ridículo pensar que em 10 anos de banda, o
Facada só tocou 2 vezes no Sudeste onde a gente tem o maior público.
James: Bem, a gente tá afim de ir pra
Europa, mas organização realmente não é nosso forte, mas espero que este setor
esteja sanado até ano que vem. Nosso antigo batera, Dangelo, por conta de sua
vida, teve que sair da banda e o David entrou e a gente agora que vai organizar
a parada, renovar o merchandise (se liguem!) até o fim do ano. A gente enfrenta
as dificuldades mas não se lamenta muito não, somos bem realistas.
15 -
Cada vez mais vemos ótimas bandas vindas da região nordeste do Brasil. Alguns
dos melhores álbuns lançados nesse ano de 2013 são de bandas daí, como o
Facada, Cangaço, JackDevil, SOH. Como é a cena por ai?
James: A cena é bem prolífica, muitas
bandas boas como em todo o país. Hoje essa diferença geográfica já não importa
tanto como antigamente, pelo menos conceitualmente e musicalmente falando. Até
mesmo equipamentos estão mais baratos, a informação está fluindo. Apesar da
nossa cena ser ínfima.
Ari: James tá muito diplomático.
Vou falar do lado ruim. Fortaleza definitivamente não uma boa cidade pra quem
faz nosso tipo de música. É provinciana ao extremo, é picuinha, inveja e muita
gente vivendo numa realidade paralela criada para o seu próprio bem-estar
psíquico. Odeio falsidade, no meu segundo dia de férias aí, veio um cara de uma
banda falar mal de um dono de um estúdio. Falou horrores durante uns 15
minutos, aí perguntei: “Tu já me fala isso faz uns bons 6, 7 anos, novidade
nenhuma. Por que tu continua indo gravar lá, tu já falou isso tudo na frente
dele? Tem que falar pra ele, não pra mim”. Me disse que não, senão teria outro
estúdio pra gravar, típico comportamento fortalezense, evitar o confronto. E
tudo continua na mesma merda.
Ainda de férias em Fortaleza dois jovens que
gostavam do Facada, vieram falar comigo em um show e falaram sobre suas bandas
e de como estavam batalhado pra ganhar um edital público pra gravaram seu
primeiro disco e fazerem uma tour nacional. E me perguntaram se a gente já
tinha ganhado algum. Disse que nunca tínhamos ido muito atrás, mas iríamos pra
agilizar uma tour europeia. Os editais existem e devem ser utilizados, mas não
se pode deixar escravizar por eles.Porque pra onde você olhar no mundo, de
todas as bandas clássicas, de qualquer estilo do rock, nenhuma delas fez
carreira através de mecenato estatal, eles tiveram espaço porque elas era boas
e tinham um público apoiando.Os meninos olharam torto e disseram que tinham
contatos e iam descolar esse edital. Aí você vê que a corrupção, favorecimento
ilícito, apadrinhamento, tudo de podre que faz com esse país seja uma piada tá
em todo canto. Meritocracia?Jamais! É Brasil, artista grande, popular,
ultra-comercial e ricos pegando muita grana pública pra montar show
superfaturado. No cinema é a mesma coisa, tem sempre aquele grupinho de
cineastas/publicitários que sempre vão levar uma graninha pra fazer filmes
insignificantes, dá nojo. Evidentemente tem gente séria que merece esse apoio
em Fortaleza. Mas tem uma nova geração que acha normal criar uma carreira
artificial sustentada por politicagem e público acéfalo,mas eles não vão
enganar ninguém a não ser eles próprios. Eu acredito na sobrevivência do mais
apto , quem for forte e bom de verdade vai sobreviver, apesar da inúmeras
adversidades de manter uma banda numa cidade morta.
16 -
Como é ser uma banda de Metal extremo no Brasil?
James: É bem fácil. Extremo mesmo é
passar fome.
17 - Tenho
visto recorrentes reclamações de bandas nacionais a respeito da dificuldade em
se fazer shows e da falta de apoio do público a nossa cena, já que muitas vezes
preferem comparecer apenas a shows de bandas estrangeiras, mesmo que hoje
tenhamos nomes tão bons quanto os lá de fora. Ao mesmo tempo, vemos bandas
brasileiras que não recebem apoio algum do público nacional, mas que possuem
respaldo e respeito no exterior, fazendo turnês pela Europa e Ásia. E para
completar o pacote, vemos bandas e público reclamando da falta de
profissionalismo de produtores e casas de shows. Não caímos ai em uma
contradição, já que para termos uma cena mais profissional e um circuito de
shows, deveria existir apoio do público nacional a nossas bandas? Como enxergam
essa espinhosa questão?
Ari: Fazer tour no exterior não é
tão complicado e nem tão glamouroso quanto parece. É meio que tirar férias tocando com a banda,
o prejuízo é iminente, mas a diversão é grande. E você vai ter experiências que
nem sonharia se ficasse pra sempre no Brasil, é divertido sem dúvida. A grande
lição que vejo aqui na Europa é o DIY (N.R.: Do It Yourself - Faça você mesmo) tanto da parte punk como metal, dos
pequenos shows que raramente tem mais de 150 pagantes, mas onde se encontra a
nata da melhor música extrema feita neste planeta. Mainstream é negócio, selos
explorando bandas, gente que faz isso por dinheiro e nada mais, ego, pose,
discurso vazio, megalomania, teatro de horrores,na maioria das vezes música
ruim, tô fora. Quando entra gente exclusivamente atrás de $ a coisa começa
feder, em qualquer lugar do mundo. Você deve apoiar quem você gosta
independente de nacionalidade, se chegar um dia e não tiver uma boa banda no
Brasil, que acabe a cena.
James: Cara, sinceramente eu acho
esse papo dessas reclamações uma balela sem limites. O que não faltam são
shows. É só você ver a quantidade de shows em todas as cenas possíveis. Mais
nas cidades grandes eu acho, mas o interior está crescendo e tem feito bons
shows. Agora, se você espera que todo show seja uma super estrutura, um som
enorme, camarins, você realmente está em outra realidade, amigo. Os show são
pequenos realmente e quem se importa? Bandas "grandes" no nosso
estilo lá fora, por exemplo, tocam pra 100/150 pessoas, isso em uma boa
expectativa, mas são várias cenas envolvidas. Tem uma galera aqui no CE que faz
eventos numa sala de aula de uma Universidade e já rolaram vários shows lá.
Sempre enche e geralmente com as mesmas pessoas e outras mais novas que vem e a
cena vai crescendo. A gente já tocou lá e pra nós tá ótimo. Talvez essa cena do
Heavy Metal espere essa coisa mais mainstream de grandes públicos, casas
enormes e fogos e todas essa palhaçada. Pra mim, isso não é underground e na
verdade, não tenho nenhum conhecimento, muito menos acompanho esse tipo de
banda. Esse metal mainstream de capas de revistas, esse mundo ilusório do
"rock star" e do apadrinhamento, conchavo e assessorais de imprensa,
realmente não me interessa. A cena que eu conheço, pelo menos está muito ativa.
Muitos lançamentos, muitas bandas novas e gravando e gente fazendo shows, gigs,
tours. Não tem essa de ter uma instituição suprema, onde temos os arautos dos
bons costumes do heavy metal por que eles são os antigos. Cada um faz seu corre
naturalmente, sem forçar a barra nem a amizade. Essa atitude de apoiar o metal
nacional é de uma burrice e nacionalismo estúpido absurdos. Quando eu gosto de
uma banda, pouco me importa de onde ela seja. Ela tem que ser boa e real pelo
menos. Sei que aqui, nossa música não é apoiada, mas, o que é apoiado aqui? A
saúde está a míngua, transporte público não funciona, a cidade é um colapso,
não tenho cara de reclamar de uma coisa tão insignificante. Seria uma vergonha
pra mim, alguém chegar e dizer que curte minha banda ou que comprou o CD pra
apoiar o metal nacional. Prefiro que você nos odeie, a apenas nos ouvir por
causa de uma nacionalidade. A gente já tocou p/ um bocado de gente em
Festivais, tocamos no meio da rua, como também pra 25 pessoas em um squat em
Salvador, cada um com a sua peculiaridade, cada um com seu acerto. Não dá pra
generalizar. Não existe mais essa da banda "acontecer", de andar de
ônibus da banda, de ser estrela, de ter atitude rock, não existe mais isso e
essa galera só precisa acordar pra esse fato.
18 -
Gostaria de agradecer pela entrevista e ceder o espaço a vocês para
considerações finais.
Ari: Obrigado pelo espaço.
James: Quem se interessar procura
facadanagoela na net. Desistam. Show no mercy. Valeu.
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