quarta-feira, 6 de maio de 2020

Paradise Lost - Obsidian (2020)


Paradise Lost - Obsidian (2020)
(Nuclear Blast/Shinigami Records - Nacional)


01. Darker Thoughts
02. Fall from Grace
03. Ghosts
04. The Devil Embraced
05. Forsaken
06. Serenity
07. Ending Days
08. Hope Dies Young
09. Ravenghast
10. Hear the Night (bônus track)
11. Defiler (bônus track)

“Você não é todo mundo!”. O caro leitor deve estar se perguntando o que a frase dita por 10 entre 10 mães no mundo faz em uma resenha crítica a respeito do novo álbum do Paradise Lost. Realmente, é uma forma pouco usual de se começar uma resenha, não posso negar, mas logo ela terá sua razão de estar aqui. Surgido em 1988, em Halifax, Inglaterra, o quinteto escreveu seu nome na história do Metal com uma carreira sólida e recheada de álbuns de grande qualidade, fora o mérito de serem considerados por muitos, o responsável pela criação do Gothic Metal como o entendemos hoje. Com tudo isso, e com mais de 3 décadas de estrada, qualquer banda se acomodaria nos louros da vitória e se limitaria a zona de conforto, fazendo apenas o feijão com arroz. Mas o Paradise Lost não é todo mundo. Não é, nunca foi e provavelmente nunca será.

Tudo nessa vida é mutável, e uma atitude que possamos vir a ter hoje, vai ter reflexos lá na frente. É algo que não só afeta a nossa vida, mas também a das pessoas em nosso entorno. Viver não é  estático, e tudo sempre está em constante mudança. Porque então a carreira do Paradise Lost deveria ser diferente? São 32 anos se reinventando álbum após álbum, se recusando a cair na estagnação e no apego ao passado de muitos outros nomes de sua geração. Elementos do passado sempre podem, e são resgatados, mas o foco é sempre seguir adiante, e é isso que fazem em Obsidian, sem 16º álbum de estúdio, que será lançado no dia 15 de maio pela Nuclear Blast, e que sairá no Brasil através da parceria com a Shinigami Records.


Uma coisa que sempre me chamou a atenção no Paradise Lost é a sua capacidade de soar único. Você consegue se deparar com bandas que emulam até o talo nomes como Metallica, Black Sabbath, Led Zeppelin ou Iron Maiden? Sim, e exemplos temos aos montes por aí. Normalmente elas ultrapassam o limite da influência e acabam soando com cópia dessas lendas do Rock/Metal. Isso já não ocorre com o Paradise Lost, já que não encontramos que consiga emular sua sonoridade. Claro, temos diversos nomes onde a influência do quinteto de Halifax se torna evidente, mas nenhum que soe idêntico. Isso se dá por um motivo simples, Nick Holmes e Gregor Mackintosh são músicos únicos. Eles são os alicerces sobre os quais se levantam as estruturas muscais da banda. A voz de Holmes, além de variada, soa marcante, sombria e escura, enquanto Gregor é um guitarrista com uma identidade única. Você sabe que é ele na primeira nota, e todo o clima melancólico presente na obra da banda é oriundo disso. É essa sua capacidade ímpar que consegue ligar álbuns aparentemente díspares como Gothic (91), Host (99) ou Faith Divide Us – Death Inite Us (09). Vale deixar claro que isso de forma alguma tira a importância e o brilho dos demais integrantes. Sem a brilhante guitarra rítmica de Aaron Aedy, Mackintosh não estaria livre para mostrar sua genialidade, sem a força do baixo de Stephen Edmondson e da bateria de Waltteri Väyrynen, muito se perderia. Preste atenção no desempenho dos mesmos em Obsidian, caso tenha alguma dúvida a respeito disso.

Vindo de dois álbuns que mergulharam fundo nas suas raízes Death/Doom, The Plague Within (15) e Medusa (17), o Paradise Lost optou por uma leve mudança de rumo em Obsidian, dando mais variedade as suas músicas. Trazendo para o centro do palco elementos não só do Gothic Metal de outrora, como da cena gótica dos anos 80 – sim, estamos falando de The Sisters of Mercy, The Mission e afins –, entregam aos seus fãs um trabalho mais refinado e com mais melodias, mas que em momento algum abre mão do peso e do clima sombrio que lhe é inerente desde Lost Paradise (90). Partindo dos vocais e passando pelas guitarras, tudo aqui soa mais diversificado, intenso e emocional que em seus antecessores, se é que isso é possível considerando a qualidade dos mesmos. Reparem também na força do baixo de Edmondson e em como Waltteri Väyrynen é um baterista muito, mas muito acima da média.

A abertura se dá com “Darker Thoughts”, e já digo, não se deixe enganar com os dedilhados de violão, os violinos e os vocais suaves de Nick, pois lá pelos 2 minutos de canção ela explode em peso e rosnados nervosos. Com um refrão fortíssimo, segue alternando entre passagens mais suaves e mais pesadas, criando uma atmosfera etérea. Já tendo sido lançada como single, “Fall from Grace” é a música que mais se aproxima do que o Paradise Lost fez em seus últimos álbuns, esbanjando peso e agressividade, obstante a boa dose de melancolia que é adicionada nos momentos em que os vocais limpos surgem. O solo de Gregor é outro fator de destaque. A faixa seguinte, “Ghosts”, é um mergulho no submundo dos clubes góticos de proliferavam no underground londrino dos anos 80. Seus riffs, sua guitarra atmosférica, o refrão grudento, tudo remete a cena gótica do período. É a prova da capacidade única que o Paradise Lost possui de mesclar suas influências de Pós-Punk e Goth Rock com Metal. “The Devil Embraced” alterna muito bem vocais limpos nos versos com os rosnados de Nick no refrão, gerando assim um clima bem sombrio e melancólico. Se prestar atenção, você vai conseguir sentir um pouco daquela aura do Gothic aqui.


“Forsaken” vai remeter o ouvinte diretamente aos tempos do Draconian Times com seus riffs fortes e marcantes, clima gélido e um trabalho de bateria que beira o primoroso. Na sequência, uma das músicas mais brutas do álbum, “Serenity”, um Death/Doom com guitarras pesadas e vocais intensos, que vai agradar aos mais saudosistas. Mostrando que o comodismo não é algo que faz parte do seu DNA, o Paradise Lost não tem medo de buscar novos caminhos para sua música, e observamos isso de forma bem clara em “Ending Days”. Por mais que ela tenha todas as características que marcam sua sonoridade, ela não se encaixaria em nenhum trabalho anterior, com seu clima sombrio e sufocante. Aqui, mais uma vez, o baixo e a bateria brilham. Sabe aquele clima Goth Rock de “Ghosts”? Ele ressurge com força na ótima “Hope Dies Young”, com um que de The Sisters of Mercy, e se encaixaria tranquilamente em um álbum como One Second (97). Encerrando a versão padrão do álbum, temos a épica “Ravenghast”. O piano da introdução já dá o tom fúnebre da canção. Com riffs desoladores e clima angustiante, é sem dúvida alguma a faixa mais pesada de todo álbum, e não soaria deslocada no Medusa, por exemplo. Na versão em digipack, temos mais 2 faixas, “Hear the Night” e “Defiler”, que seguem a mesma linha do álbum, abusando do peso e da melancolia.

Podemos dizer sem medo que o Paradise Lost encontrou em Jaime Gomez Arellano o seu parceiro perfeito, já que ele parece entender a sonoridade da banda como poucos produtores nesse mundo. Mais uma vez ele, ao lado da banda, foi o responsável pela produção, e o resultado é simplesmente ótimo. Cada mínimo detalhe pode ser notado, todos os instrumentos estão perceptíveis, tudo claro e cristalino. Ainda sim, não temos aquela sonoridade plastificada e artificial, já que é um álbum bem orgânico nesse sentido. Sombrio, escuro, intenso e melancólico, Obsidian comprova de uma vez por todas que o Paradise Lost não só se encontra em seu auge criativo, como está muito a frente da concorrência. Vivemos uma época tão dura e de tantas incertezas, e que agora tem sua trilha sonora. Uma experiência catártica, e sem dúvida, forte candidato a melhor álbum de 2020.

NOTA: 94

Formação:
- Nick Holmes (vocal);
- Gregor Mackintosh (guitarra);
- Aaron Aedy (guitarra);
- Stephen Edmondson (baixo);
- Waltteri Väyrynen (bateria)


sexta-feira, 1 de maio de 2020

Deathwhite - Grave Image (2020)


Deathwhite - Grave Image (2020)
(Season  of Mist - Importado)


01. Funeral Ground
02. In Eclipse
03. Further from Salvation
04. Grave Image
05. Among Us
06. Words of Dead Men
07. No Horizon
08. Plague of Virtue
09. A Servant
10. Return to Silence

Para quem não conhece o Deathwhite, se trata de um coletivo de músicos que se reuniu em 2012, com o intuito de criar um projeto de estúdio, e que optou por manter as identidades de seus membros em segredo. O que se sabe é que são americanos, oriundos de bandas de vertentes mais extremas do Metal, e que todos são apaixonados pelo Discouraged Ones, do Katatonia. Musicalmente, como o leitor pode imaginar dada a última afirmação, se enveredam pelos campos do Doom/Gothic Metal, com elementos de Post Metal, gerando assim uma mistura bem interessante.

Seu debut, For a Black Tomorrow, foi um dos melhores lançamentos de 2018, o que gerou em mim uma certa ansiedade por esse novo trabalho. Conseguiriam manter o alto nível de qualidade apresentado, ou sucumbiriam a maldição do segundo álbum, que já vitimou vários nomes promissores na história da música pesada? A resposta veio através de Grave Image, que não se limita a ser uma simples repetição do seu antecessor, mas se mostra uma continuação natural do mesmo. A inclusão de um segundo guitarrista na formação, deixou seu som um pouco mais pesado e sofisticado se comparado com a estreia, e o que já era muito bom, se tornou ainda melhor.

Mas não é só o maior peso que chama a atenção de cara. Grave Image também se mostra mais sombrio, um retrato dos tempos atuais, a era da pós-verdade, onde esta é distorcida diariamente, e os saberes são contestados por achismos de pessoas que mal possuem coordenação motora para andar e respirar ao mesmo tempo. As composições também se mostram mais ricas e coesas, e com belas melodias, que vão agradar em cheio aos fãs de nomes como Katatonia (óbvio), Paradise Lost, My Dying Bride, Swallow the Sun, Anathema e afins. As canções são altamente imersivas, e criam um jogo de luz e sombra muito interessante, já que, ao mesmo tempo que apresentam paisagens sonoras desoladoras e depressivas, conseguem te fazer sonhar profundamente.


Esse é um trabalho bem homogêneo, e um fio de melancolia perpassa cada uma das canções aqui. A abertura se dá com a forte “Funeral Ground”, de atmosfera taciturna e fria, com guitarras sombrias e boas melodias vocais. “In Eclipse” já mostra suas armas logo de cara, com riffs pesados, forte carga gótica e refrão que te pega com facilidade. Na sequência, temos a elegante e pesada “Further from Salvation”, um “doomzão” com cara de My Dying Bride, algo que também podemos observar na ótima “Grave Image”, com bom peso e melodias sombrias. “Among Us” tem uma vibe que remete ao Katatonia e um trabalho bem interessante de guitarras; “Words of Dead Men” tem um ar sofisticado e alternativo, e “No Horizon” se destaca principalmente pelos ótimos vocais e um bom desempenho da dupla guitarra/baixo. “Plague of Virtue” é uma homenagem declarada da banda ao já citado álbum Descouraged Ones, do Katatonia, e tudo aqui remete ao mesmo. Na sequência final, a emotiva “A Servant” e a sombria “Return to Silence”.

A produção e mixagem ficaram novamente por conta de Shane Mayer, com masterização de ninguém menos que Dan Swanö (Bloodbath, Katatonia, Novembers Doom, October Tide, Opeth, Pain of Salvation, Rage). O resultado é não menos do que ótimo, com tudo muito claro e audível, mas ainda sim pesado. A capa, candidata a uma das mais belas de 2020, foi obra de Jérôme Comentale, e conta com a imagem da estátua de Giordano Bruno, matemático, filósofo e cosmólogo italiano medieval, que foi queimado pela Inquisição Católica. Cabe dizer que a mesma se encontra localizada no Campo de 'Fiori em Roma, Itália, local exato onde foi executado. Altamente emocional, sombrio, imersivo, e mesclando escuridão e beleza como poucos, o Deathwhite entregou um dos grandes álbuns do ano. Para se ouvir sentando na sala, de luzes apagadas, com uma bebida em mãos e refletindo a respeito dos tempos escuros que vivemos.

NOTA: 88

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